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Conhecer de perto a sede do antigo DOPS (Departamento de Ordem Política e Social), em São Paulo, pode ser algo meramente curioso para alguns, ou tenebroso, doloroso para tantos outros que ali ficaram presos. Mas o atual Memorial da Resitência, no largo General Osório nº 66, bairro da Luz, (anexo da Pinacoteca do Estado), é muito mais do que isso.
O prédio foi projeto em 1914 pelo arquiteto Ramos de Azevedo, originalmente para funcionar como armazém da Ferrovia Sorocabana. Em 1924, o DOPS foi criado para combater os movimentos “subersivos” que “ameaçam” o país e, no largo da General Osório, a construção virou prisão, entre 1935 e 1984 – quase 50 anos.
Por lá passaram desde o escritor Monteiro Lobato, a militante feminista Patrícia Galvão – a Pagu - e seu marido, o escritor Oswald de Andrade, a artista plástica Anita Malfatti e o líder comunistas Luis Carlos Prestes.
Depois do golpe militar de 1964, que semeou a ditadura no Brasil, as celas foram ocupadas por militantes do movimento estudantil como José Dirceu, Vladimir Palmeira (presos depois do famoso 30º Congresso da UNE em Ibiúna, que terminou com a prisão de cerca de 700 estudantes), a cantora Elis Regina e até Luiz Inácio Lula da Silva, então um “perigosíssimo” líder sindical.
Além de centro tortura, o DOPS também reunia informações, documentos, cartazes, livros e toda e qualquer coisa que pudesse comprovar a “subversão” dos que ali eram reclusos – inclusive de pessoas que não tinham qualquer relação como a militância política, estudantil ou sindical, mas que eram arbitrariamente fichadas.
Nos anos de chumbo de nosso país, um simples livro podia ser motivo para prisão e tortur as. E por falar em arbitrariedade, então…Era nesse prédio da Gal. Osório onde ficava o assassino, protagonista de algumas das maiores atrocidades da ditadura, o delegado Sergio Paranhos Fleury.
Mas por que visitar um lugar como o Memorial da Resistência? Por que entrar num local que foi presídio e ainda sede do DOPS? Porque o prédio é um símbolo real das memórias de ex-presos políticos, das barbaridades sofridas por eles, mas, especialmente, símbolo de luta e resistência dessas pessoas em nome da democracia.
O Memorial da Resistência também representa um pedaço de nossa história ainda obscuro, seja porque hoje a maioria dos jovens hoje desconhece a história do Brasil durante a ditadura militar (1964-1885), ou mesmo porque até os dias atuais os arquivos daqueles tempos continuam fechados.
Até hoje não se sabe quem foram os autores das torturas, assassinatos e desaparecimentos de presos. Quantos estão aí impunes, vivendo como inocentes? E, pior, quantos ainda ocupam cargos públicos e tem seus salários pagos por nós?
Para não nos esquecermos das lutas do passados, e das lutas ainda hoje necessárias, vale a pena, sim, visitar o Memorial da Resistência e conhecer suas histórias.
Para saber mais:
Textos e livros
Ditadura militar no Brasil (Wikipedia)
A ditadura envergonhada/A ditadura escancarada, livros de Elio Gaspari (Companhia das Letras – 2002)
Direito à memória e à verdade, livro-relatório organizado pela Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (acesse o PDF gratuito on line)
Dos filhos deste solo, de Nilmário Miranda e Carlos Tibúrcio
Batismo de Sangue, de Frei Betto
A grande partida: anos de chumbo, de Francisco Soriano
Documentários:
Hércules 56, direção de Silvio Da-Rin
Em Nome da Segurança Nacional, direção de Renato Tapajós
Vlado – 30 anos depois, direção de João Batista de Andrade
Ato de fé, direção de Alexandre Rampazzo
A grande partida: anos de chumbo, direção de Peter Cordenonsi
Filmes:
Batismo de Sangue, de Helvécio Ratton
Texto/fotos: Flaviana Serafim e Gladstone Barrreto
Dizem que no Memorial do Holocausto em Washington, EUA, além de todo acervo, cenografia e documentação, há a questão do cheiro. Como muitas peças de vestuário e cenográficas são originais, muita gente diz que há o odor da tristeza, da morte.
ResponderExcluirTudo pode ser tão perfeito que nos leva ao odor, sei lá.
E o DOPS, cheira?