São Paulo lado A,B,C,D…
Por Flaviana Serafim
Atravessar a rua: um ato simples e rotineiro - mas não em São Paulo. Na constante pressa paulistana, que justifica qualquer loucura, os motoristas circulam pela cidade preocupados somente com o espaço deles e de seus carros.
Estava de mãos dadas com minha filha de quatro anos, aguardando a vez de atravessar o cruzamento da avenida Ipiranga com a Praça da República, quando o sinal verde finalmente apareceu para nós.
Havia trânsito, motoristas parados, impacientes, e eis que surge, do nada, um taxista daqueles apressadinhos. Foi acelerando, avançando o carro sobre a faixa e as dezenas de pedestres. Depois, olhando nos meus olhos, acelerou mais um pouco e o veículo chegou a menos de dois palmos do local onde eu e minha filha atravessávamos.
O taxista certamente não era cego. Então, o que explica tamanha covardia e estupidez? Por que esse cara avançou sobre a faixa de pedestres, com dúzias de pessoas atravessando?
Meu primeiro impulso foi erguer a mochila de rodinhas que minha filha leva para a escola, e jogá-la sobre o capô do carro. Isto eu fiz. Como outros pedestres, revoltados, segui fula da vida e xinguei o taxista.
O segundo impulso era arrebentar o vidro daquele carro, tamanho meu ódio pelo maldito taxista. Isto eu não fiz. Sabe aqueles momentos em que, por milésimos de segundos, deixamos de fazer uma grande besteira? Pois é, tive a benção de baixar a mochila, respirar e afastar esse pensamento horrível.
Nos dias seguintes, fiquei passada com aquela cena. Não só a do taxista, mas também a minha acertando o capô do carro com a mochila.
Podia justificar minha atitude recorrendo ao instinto de mãe, de fêmea protegendo os filhotes. Porém sou racional, humana passível de erro, mas me igualaria aquele taxista se apelasse para o instinto como justificativa.
Neste 2 de outubro, acho maravilhoso o início da Marcha Mundial pela Paz e a Não-Violência, que percorrerá 90 países dos cinco continentes. Neste dia, em 1869, nasceu Mahatma Gandhi.
Entretanto, com ou sem mobilizações, percorrendo o planeta ou parada em frente ao computador, chego à conclusão de que a paz não começa fora de nós.
A paz começa dentro de mim - na simples travessia de uma avenida paulistana; no caixa rápido do supermercado, quando chega aquela pessoa com carrinho cheio; pegando o ônibus e vendo alguém furando a fila; de manhã, ouvindo notícias sobre a política nacional que dão mil motivos para sobrecarregar o fígado.
É internamente que escolho passar o dia cheia de ódio ou de paz. Sem marchas, sem cartazes, sem um passo sequer. A paz existe e só pode começar dentro de nós.
Foto do site http://www.mkgandhi.org/
Simples e direto, Flviana!
ResponderExcluirAqui, esse motorista ia pegar 3 anos de cana sem fianca, por puro flagrante.
Besos!
Aqui, Nei, acredite - o cara passou em frente ao posto da Polícia Militar na Praça da República. Estacionou o táxi a poucos metros do posto móvel e saiu do carro tranquilamente...
ResponderExcluirSe eu acertasse o vidro do carro dele...tava ferrada na certa.
Coisas terríveis da terra brasilis...
Besos,
Flaviana
Não adianta nada fazermos grandes marchas se não conseguimos praticar a paz nas nossas pequenas ações.No mundo de loucuras é difícil mesmo praticá-la.
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