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Em polêmico editorial, Folha de S.Paulo afirmou que os 21 anos de ditadura brasileira foram “ditabranda”
O ato “Abaixo a ditabranda”, reniu cerca de 400 pessoas na manhã de sábado (07.03) em frente a sede do jornal Folha de S.Paulo, na rua Barão de Limeira (Campos Elísios, região central paulistana).
O protesto foi contra a palavrinha “ditabranda”, publicada no editorial “Limites à Chavez”, em 17 de fevereiro. A iniciativa foi organizada pela ONG Movimento dos Sem Mídia, de Eduardo Guimarães.
O editorial fazia uma crítica ao resultado do referendo realizado recentemente na Venezuela, que permitirá, indefinidamente, a reeleição para presidente no país. O referendo foi aprovado por livre e espontânea vontade dos venezuelanos.
A questão é que o período de ditadura militar vivido pelos brasileiros entre 1964 e 1985 – 21 anos ao todo – foi classificado pela Folha de S.Paulo entre "as “ditabrandas’ (de) países que partiam de uma ruptura institucional e depois preservavam ou instituíam formas controladas de disputa política e acesso à Justiça(…)”.
Jornalistas, professores, a dvogados, entidades de defesa dos direitos humanos, ex-presos políticos e vários outros leitores ficaram indignados com a tal “ditabranda” publicada pela Folha. Deve ter chovido e-mails xingando a famílias Fria, dona da Folha, e também o infeliz editorialista.
O primeiro leitor a ter sua carta publicada foi Sérgio Pinheiro
Lopes, que simplesmente questionou “quantos mortos, desaparecidos e expatriados são necessários para uma ‘ditabranda’ ser chamada de ditadura?”.
E aí, acreditem, em sua resposta a Pinheio Lopes, publicada no Painel do Leitor, a Folha de S.Paulo afirmou sem pestanejar que “na comparação com outros regimes instalados na região no período, a ditadura brasileira apresentou níveis baixos de violência política e institucional”.
Para Folha, indignação de leitores foi “cínica e mentirosa”
Depois, ao publicar manifestações de repúdio dos professores da Universidade de São Paulo, Fabio Konder Comparato e Maria Victoria Benevides, o jornal publicou a seguinte nota da redação:
“a Folha respeita a opinião de leitores que discordam da qualificação aplicada em editorial ao regime militar brasileiro e publica algumas dessas manifestações (...) Quanto aos professores Comparato e Benevides, figuras públicas que até hoje não expressaram repúdio a ditaduras de esquerda, como aquela ainda vigente em Cuba, sua ‘indignação’ é obviamente cínica e mentirosa”
A rua Barão de Limeira deveria ter recebido umas 10 mil pessoas no ato “Abaixo da ditadura”, no mínimo.
300 ou 400 pessoas em frente à sede da Folha nos mostra que os jovens brasileiros não estão aprendendo história. E o mais velhos perderam a memória.
Faz só 24 anos que a ditadura acabou e ninguém mais se lembra das pessoas mortas, torturadas, estrupradas, das famílias dizimadas.
As pessoas se esqueceram dos exilados, de vidas covardemente destruídas. Mortos esquartejados, corpos desaparecidos e sem sepultura. Mães que sequer tem onde velar seus filhos perdidos.
Quantos aqui sabem o que foi a guerrilha do Araguaia? Ou quem foi Emílio Garrastazu Médici? E como morreu David Capistrano? E como jornalista Wladimir Herzog se “suicidou” numa cela do DOI-Codi?
Em frente da seda da Folha de S.Paulo, o leitor
Sérgio Pinheiro Lopes (acima) discursou:
“Escrevi carta por um motivo básico: eu não queria que meus filhos e netos, que não viveram nesse tempo (da ditadura), fossem sujeitos a uma falsa interpretação da história. Minha mão deu sorte aquele dia”. E finalizou: “Ditadura é ditadura, ‘ditabranda’ é a p…”.
Texto/fotos: Flaviana Serafim e Gladstone Barreto