Povos de São Paulo, tribos do mundo
Por Nei Schimada
ESSA
Quando certa manhã um estranho inseto acordou de um sono pesado e intranquilo, encontrou-se numa cozinha metamorfoseado num ser humano monstruoso sentado à mesa com uma xícara de café aguardando uma ação rotineira. Levantou-se. As seis finas patinhas viraram duas no chão e duas penduradas, ridiculamente rosadas.
O cérebro, que era mínimo, cresceu até a estranha possibilidade da crença que há mundos invisíveis e felizes depois da morte e, mesmo assim, o homem em pé na cozinha soube, calado e atento ao que era possível ao redor, que nada, de fato, mudara.
Havia uma sensação chamada angústia. Quando se embrenhava pelo lixo e através das paredes de todos os lugares, bastava estar vivo e safar-se de eventuais objetos arremessados por bípedes tão angustiados quanto este na cozinha. Essa angústia, produto originário da química possível num organismo de sangue quente e neurônios at vacuum, estava lá porque não teria utilidade quando se rastejava pelas paredes.
OUTRAS PIORES
(1) Vinte e Três de Maio
Calor sufocante e o ônibus lotado, rodeado de automóveis abarrotados de um único motorista, ar condicionado e música ambiente.
Alguém lá no miolo do coletivo gritou:
- Se uma ovelha!
Todos gritaram:
- Se uma ovelha!
A mesma pessoa continuou:
- Se uma ovelha lhe contar uma anedota, ria até doer-lhe o diafragma.
Todos repetiram aos prantos.
(2) Praça da Bandeira
Se uma ovelha lhe contar uma anedota, ria até doer-lhe o diafragma, faltar o ar. Ria até sentir ânsia de vômito. Anote a piada. Guarde-a. Afaste-se da pessoa e entenda de uma vez por todas que os melhores contadores de história são os lobos, hienas e coiotes. Não nessa ordem, mas nessa direção.
(3) A Peça, Dois Atos e Nada de Pausa
Campainha blimblom. Desci as escadas correndo com a cena inteira pronta na cabeça. Bastava teclar algumas centenas de letras, sinais gráficos e espaços para depois continuar do mesmo jeito até achar que deram as duas horas de ação e díálogos que meia dúzia de cinquenta sentados resolveram assistir para divertir-se, mesmo sendo uma tragédia com dois atos e nada de pausa.
A boa desgraça é sempre a que nos contam, não a que protagonizamos, agonizamos.
Pois bem, te digo que essa peça está salva num limbo entre a razão e um tiro de escopeta com o cano machucando o palato e espremendo a língua dos infelizes. Depois falam “que azar, meu deus”.
Exatamente no momento em que eu descia as escadas, caiu um raio aqui perto, a luz da casa apagou-se, abri a porta e eram dois mórmons, ambos de terno, um de óculos, outro de bigodinho adolescente e nós três olhando para o céu. Quando lembrei do texto da peça, à velocidade da luz, da luz do céu e da luz cujas contas debitam todo mês, os trinta e cinco mil demônios medrosos dos mórmons queimaram o computador e a minha fé em fundamentalistas e ateus.
Nei Schimada, 43, punk, poeta e dekassegui, escreve de Hamamatsu shi - Japão. É blogueiro da
Estrovenga dos Corsários Efêmeros. Leia mais em:PAULISTANO QUE É PAULISTANO NÃO CHORA
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Oi gente, dá uma conferida no meu e-mail mais recente, por favor!
ResponderExcluirObrigado!
Besos!
Menção honrosa ao SP Urgente lá na Estrovenga. Confere.
ResponderExcluirBesos!
Blz de Nariz!!!
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